Quando alongar: antes ou depois da musculação?

Devemos alongar antes da musculação para preparar os músculos e articulações para o esforço ou será melhor alongar depois, para manter a flexibilidade muscular que é diminuída pelo treinamento de força?
Não considero verdadeiro que a pratica de alongamento seja uma boa preparação para exercícios de força intensos. Diz-se que é importante alongar-se antes da musculação porque isso supostamente preveniria de lesões que poderiam ocorrer durante o treino. Penso que a preparação para exercícios vigorosos, tal como a musculação, passa por estimular e aquecer o corpo inteiro.
O aumento da temperatura corporal torna os tecidos das estruturas articulares – ligamentos, tendões, cápsulas, fáscias e músculos – mais elásticos. Por outro lado a estimulação neuromuscular – que também é facilitada pelo aquecimento corporal – permite reações mais rápidas de contração e relaxamento dos músculos. Tanto a elasticidade tecidual aumentada, como músculos mais “despertos” (estimulados neurológica e bioquimicamente) e com reações mais rápidas, potentes e precisas, configuram uma situação potencialmente protetora contra a possibilidade da ocorrência de lesões.
Contrariamente, ao menos no plano teórico, o alongamento pode reduzir a estabilidade articular e aumentar a possibilidade de se fazer um movimento inadequado que induza à lesão.
Um segundo aspecto a ser considerado é que o alongamento “estático”, que é o mais preconizado nas academias, embora seja uma das formas mais seguras de se alongar, produz um efeito “calmante” sobre o músculo. Ocorre uma inibição neural que faz com que a eficiência (velocidade e intensidade) da contração diminua. Portanto imediatamente após uma sessão de alongamento o desempenho de força e velocidade será menor e o treino, provavelmente, menos eficiente.

Podemos nos perguntar se o aquecimento da temperatura corporal é suficiente para adentrar num treino de musculação mais intenso, sem a realização de alongamentos.
Na fase excêntrica de um exercício de musculação (aquela em que retornamos a posição inicial e mais alongada do exercício) os músculos, mesmo forcejando, são progressivamente “esticados”. Essa condição é potencialmente lesiva para eles. Logo pensamos que, em função de proteger contra possíveis lesões, devemos alongá-los previamente. O que fazer então se, por um lado, não devemos alongar porque isso poderia aumentar a instabilidade articular e, por outro, é importante preparar a musculatura para suportar o alongamento inerente ao movimento do próprio exercício? Minha sugestão é que após um aquecimento (10 a 20 min, conforme a temperatura do dia) façam-se os próprios exercícios do programa de musculação, porém, com cargas e amplitude baixas e crescentes. Isso servirá como complemento do aquecimento e será suficiente para preparar as articulações para o esforço mecânico demandado. O alongamento será feito na amplitude necessária ao próprio exercício.
Em relação a possíveis perdas de flexibilidade que o treino de musculação pode implicar, devemos considerar que isso não é uma condição inescapável. A forma e qualidade de execução dos exercícios são determinantes na perda, na manutenção ou mesmo no ganho de flexibilidade. O aspecto diferencial na execução é a amplitude de movimento durante o exercício. Um exercício realizado repetidamente com pequena amplitude fatalmente irá resultar em uma musculatura encurtada. Ao contrário, se o praticante executar o exercício com grande amplitude, a flexibilidade será mantida ou mesmo ampliada. Neste caso faço a ressalva de que a amplitude do movimento deve respeitar os limites das articulações envolvidas a fim de que não as machuquemos.

Se a intenção for aumentar a flexibilidade corporal, será necessário realizar exercícios específicos para esse fim. Mas a questão que se apresenta aqui é: qual o momento mais adequado para isso? Imediatamente antes da musculação já vimos ser inadequado. Depois da musculação também tem quesitos a ponderar. Um deles é que durante um treino vigoroso de musculação é provável a ocorrência de microlesões musculares (algumas células musculares simplesmente se rompem). Alongar músculos nessa condição pode aumentar a quantidade e o grau dessas microlesões.
Um segundo quesito a considerar é o fato de que a musculatura incha logo após uma sessão de musculação (endemaciamento devido ao acúmulo de líquidos intramusculares). Esse inchaço deixa os músculos menos propensos à elasticidade, dificultando a prática do alongamento.
Que fazer então se alongar antes é ruim e depois também? O ideal seria realizar treinos distintos em turnos ou dias distintos, mas isso é para profissionais do esporte. A maioria das pessoas não dispõe de tempo suficiente para isso. Sugiro então algumas alternativas:

1ª) Fazer o treino de flexibilidade primeiro e, antes de ir à musculação, fazer um longo aquecimento seguido de estímulos neuromusculares nas máquinas conforme expliquei anteriormente.
2ª) Fazer musculação (sem refutar o aquecimento). Alongar ao final do treino, mas não sem antes fazer um bom relaxamento e soltura da musculatura. Neste caso o alongamento deverá ser do tipo estático, porém progressivo. É importante permanecer um tempo prolongado no início de cada postura, sem forçar muito, para então, poder forçar um pouco mais e progredir com segurança na postura executada e nas posturas seguintes.

Existem ainda outras possibilidades de treinamento em que os exercícios de força são combinados com alongamentos. Essas práticas geralmente são feitas fora das máquinas de musculação e a força e o alongamento ocorrem de modo simultâneo, porém em grupos musculares de funções antagônicas, ou seja, contrai-se o grupo muscular flexor e alonga-se o grupo extensor de uma articulação e vice-versa.
Tais métodos (Pilates, Yoga, isostretching e outros) são bastante eficientes para promoção da saúde, para postura corporal e para a manutenção das capacidades motoras, mas, para quem deseja hipertrofia muscular, não são os mais apropriados.